O Forte de S. Francisco, um belo exemplar arquitectónico do século XVII, esteve muito degradado, e no início da década de 1960 começaram as primeiras demolições das casas adossadas ao baluarte sudoeste e os primeiros trabalhos de restauro do baluarte sudeste junto à já desaparecida Quinta dos Machados, hoje Rua da Pedisqueira, no entanto, talvez por falta de apoio financeiro, as mesmas pararam. Uma década depois, em início de 1970's, nova fase das obras, demolição das últimas casas adossadas ao forte e restauro do baluarte sudoeste, mas só na década de 1990 é que finalmente terminaram as obras de restauro, inclusive no seu interior, onde se encontra a Igreja de Nª Srª do Rosário.
Após a implantação da República, em 5 de outubro de 1910, os que não aceitavam essa mudança de regime começaram a organizar-se de maneira a constituírem uma força que, por qualquer meio, incluindo a revolta, pudesse instaurar o antigo regime e, nesse sentido, foram tomadas algumas iniciativas que consistiram na entrada no nosso país de forças monárquicas, conhecidas como "incursões monárquicas".
A 1ª incursão monárquica ou realista inicia-se com a tentativa de tomar Bragança, em Outubro de 1911. Não tendo sido possível, os couceiristas atacam e tomam Vinhais, hasteando a bandeira azul e branca. Chegados reforços republicanos, rapidamente entram em debandada “Entre Vinhais e Salgueiros desertaram 400 homens, exaustos, esfomeados e com sono”1. No dizer da Condessa de Mangualde, as forças realistas eram “uma mistura estranha de velhos soldados … de padres (210 segundo Vasco P Valente) e de voluntários de “boas famílias” …” e “as forças de Couceiro eram um bando improvisado, sem coesão e solidez”2, não sendo mais do que 1034 efectivos.
A última diligência de cavalaria, saindo de Vinhaes em direcção a Chaves, vendo-se no primeiro plano o civil sr. Jacinto Nogueira Ferrão,
que tem sempre acompanhado as tropas republicanas (cliché do sr. Anselmo Dias)
Na 2ª incursão, levada a cabo no dia 8 de Julho, os realistas entram por Sendim (tenente Sepúlveda) e por Vila Verde da Raia (Sousa Dias). No início das hostilidades, o governo espanhol apoiou Paiva Couceiro, mas, depois de pressionado, deu ordem de expulsão aos monárquicos.
Os realistas tinham informação de muito apoio em Chaves. “Os conspiradores de fora contavam com traição dos de dentro (…). Os conspiradores de fora acreditavam ter em Chaves força sua de bastante valor (…)” (A Região Flaviense, 1923).
Na madrugada de sábado, dia 6, um grupo de civis tentou tomar o quartel de Cavalaria 6 tendo sido impedidos, foram presos 4 indivíduos civis (Jornal de Notícias, de dia 9).
Os militares em Chaves são comandados pelos tenentes-coronéis Ribeiro de Carvalho e Custódio de Oliveira e os civis organizados pelo Dr. António Granjo.
Para memória futura e tendo em vista a heroicidade das gentes de Chaves na defesa ao ataque da República, a nível do toponímico existe em Lisboa a Avenida Defensores de Chaves, na Nazaré, Rua Heróis de Chaves e, no Porto, existiu a Rua Heróis de Chaves, (hoje Rua de D. João IV), tendo sido eliminada depois do 28 de maio.
Em Chaves foi dado o nome de 8 de Julho ao Largo do Anjo e o feriado municipal passou de 31 de Outubro para dia 8 de Julho.3
Tornamos pública uma carta inédita que nos foi gentilmente cedida. O seu teor é escrito na 1.ª pessoa (correspondência entre irmãos), logo de quem viveu este acontecimento in loco (“ …fizeram muitos tiros de peça sobre a villa, que vi cahir, algumas por cima da minha casa(Rua Direita)”.
António
Chaves
8-7-912
Os conspiradores entraram hontem, dando-se um pequeno combate em Villa-Verde, via Santa Marta, ficando ferido, mas sem gravidade um capitão do estado-maior Mário Magalhães. Hoje houve grande combate entre Chaves e Forte de São Neutel.
Aí 9 horas correu noticia de que os conspiradores estavam perto de Chaves. Efectivamente era verdade. Em face disto prepararam todas as forças que puderam (que era apenas cento e tantos soldados, porque o grosso das forças tinham partido para Montalegre) e foram ao encontro deles. A esta pequena força juntaram-se alguns policias, guardas fiscais, cavallaria e paisanos. A artilharia e metralhadoras também tinham partido para Montalegre. Pouco depois das nove horas começou o fogo,que durou até às 2 horas da tarde, hora a que chegou a artilharia de Montalegre.
Por parte dos conspiradores fizeram muitos tiros de peça sobre a villa, que eu vi cahir algumas por cima da minha casa.
Tres tiros de peça bateram na casa de José Mesquita, cortando-lhe completamente 2 tranqueiras das janelas, 2 tiros de peça atravessaram o edifício do liceu de lado a lado.E vários outros tiros que danificaram bastante alguns prédios.
Os conspiradores chegaram ao pé do cemitério. Por ultimo retiraram, deixando vários mortos e feridos, uma peça e munições.
Das forças republicanas apenas morreram um cabo, filho do coronel Sousa Dias e um soldado, e ficaram feridos o capitão Tito Barreiros, o tenente Macedo, o filho do general Carvalhal e um alferes de cavalaria, este gravemente. Nesta hora consta que os conspiradores já vao para Villela Seca, batendo em retirada.
Teu mano muito amigo
Abílio
PS No hospital militar já estao uns sete conspiradores mortos.
No hospital civil estão 2 conspiradores gravemente feridos sendo um filho do visconde da Ponte da Barca e o outro Firmino Cunha do Porto.
Nós bem, assim como toda a nossa família. Hoje passámos um dia com muito receio, mas agora já estamos tranquilos.
Já cá estão muitas forças.
Teu
Abílio
Estes acontecimentos tiveram grande repercussão nacional graças às reportagens apresentadas na “Ilustração Portuguesa” (Jornal O Século), assunto que ocupou várias das suas edições entre Outubro de 1911 e Agosto de 1912.
Inserimos aqui uma pequena apresentação com algumas das pranchas publicadas:
Muitas das fotografias publicadas na “Ilustração Portuguesa” são da autoria de Joshua Benoliel, que se deslocou ao norte para fazer várias reportagens. Do seu arquivo retirámos estas imagens:
Nos arquivos da Cinemateca Nacional existem dois documentos, em formato de filme, sobre estes acontecimentos.
Incursões Monárquicas de 1911:
Chaves, Incursões Monárquicas de 1912:
1 Aires, Ribeiro, “A República no Distrito de Vila Real”, pág 166
2 Condessa de Mangualde, “Narrativas”
3 Aires, Firmino, “Incursões Autárquicas”, pág 163 e 165